sábado, 30 de maio de 2009


Franciele era uma menina que não gostava de escrever. Tinha uma leitura fútil, desnecessária. Gastava muito com revistas, mas nada que realmente valesse à pena. Franciele era alegre, gastava seu pouco dinheiro também com maquiagem. Pintava a boca com batom vermelho. Os olhos eram carregados de sombra brilhante. Nada muito combinado e mesmo assim sentia-se bonita. Enquanto se arrumava pra sair ligava o rádio bem alto e dançava. As amigas de Franciele sempre se aborreciam com ela. Chegava atrasada, era seu costume. Franciele era alegre. A casa era uma bagunça, a mãe reclamava. Franciele sorria. “Essa menina não arruma nada! Só quer saber de namorar!”. Franciele nem ouvia. Era uma negra formosa. Magrinha que nem um cabo de vassoura. Dizia que se gostava assim, magra como as modelos magrelas da passarela. “Toda nega tem o pandeirão! Se eu não tenho faço a diferença!”. Ela gostava de si. Naquele dia quando voltava da festa com uma amiga conheceu um rapaz. Franciele ficou bem interessada. No dia seguinte ganhou de presente um livro. Era bonito, grosso, capa dura. O título parecia difícil, mas era bonito. Mostrou para suas mãe e suas amigas. Não deram importância. Jogado ali no sofá velho da casa, o livro foi perdendo seu valor, se é que um dia lhe deram. Uma semana depois, lembrando do presente “sem graça” que ganhou enquanto ficava aos agarros com o rapaz perguntou: “Pra que mesmo você me deu aquele livro hein?”. Questionada se já havia lido, abaixou a cabeça e meio envergonhada respondeu que não. Na verdade preferia um brinco, um colar, uma calcinha nova. O rapaz interessado ainda em convencê-la explicou que era um livro interessante e poderia ajudá-la em muitas coisas. Mesmo assim Franciele fez bico. Irritou-se e deixou o rapaz ali encostado sozinho no muro. Saiu correndo com um sentimento estranho no peito. Uma mistura de vergonha e desprezo. Sentiu-se pequena. Cutucaram sua ferida. Sentia queimar. Corria pela rua chorando, não sabia para onde. Percebeu que toda a formosura que enxergava no espelho não lhe valia de nada. Pra que tanto bico pintado? Pra que tanto rebolado mesmo com o “pandeiro” pequeno demais? Era pobre, sem instrução. Ali perto tinha um córrego. Descascando o esmalte vermelho das unhas decidiu. E foi ali mesmo. Água suja, escura e fétida. Num pulo só. Olhos fechados, tapando a respiração.
30/05/09

sexta-feira, 29 de maio de 2009




Fraco era um pássaro. Não. Fraco era um passarinho. Vivia numa gaiola antiga, onde diversos outros já estiveram trancados. Hoje era a sua vez. Olhava para os lados e sua visão multiplicava. Enxergava múltiplas hastes de arame ao seu redor. Arame grosso. Acreditava ser mais forte do que aquele obstáculo mas ao se bater percebia o engano. Teve que se recompor e aceitar observar a vida dalí de dentro. A vida dos outros. Questionáva-se quanto a sua vida. O que seria dela. O que seria dele. Parado em um daqueles pauzinhos de madeira olhava ao seu redor. O vento balançava suas penas violentamente. Sentiu o arrepio junto com a fome. A sede junto com a angústia. Pensou em clamar por ajuda, mas Fraco não sabia cantar. Nunca ninguém o havia ensinado. Analisando a gaiola descobriu que havia uma portinhola bem ali à sua frente. Pensou que seria fácil. Engano. Mesmo colocando toda a força no bico, Fraco nunca conseguiria abrir a pequena alavanca da portinhola. Parado manteve-se por mais alguns segundos. Chorou. Fechou os olhos e sonhou. Será que conseguiria escapar da gaiola? Será que saberia voar? Para onde iria? Agitava-se à procura das respostas... Será que um dia mudaria seu nome?

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Você pequenina
Você tão simples assim
Me faz querer-te por perto
Pequenina
Você que vem correndo
Sorrindo e vindo
Indo em busca
Você pequenina crescendo assim
Assim ventando
Assim vivendo
Assim sentindo
Assim querendo
Assim pulsando
Você pequenina que me faz respirar forte, ofegante
Quando fecho olhos vejo você aqui
Bem perto
Em cima de mim
Toda minha
Crescendo
Rindo
Gigante
Enorme
Forte
Linda
Mulher

Ao acordar


Enquanto o vento sopra a água cai
Os raios do sol entram e secam o lençol
Esquentam meu corpo gelado, meu suspiro em silêncio
Olho pela fresta da janela o caminho que tem a seguir
Fico parada
Água com sal
Penso em me mexer, mas os pés não me obedecem mais
A brisa que entra arrepia meus poros
E à sensação dos seus a acariciar os meus me leva a apertar os olhos para não ver
Lembrar de tudo, todo o tempo
Querendo mais, de novo.
Levanto e em frente ao espelho digo a mim mesma
Meu nome é saudade.